Dom Lindomar Rocha Mota
Bispo de São Luís de Montes Belos (GO)
O Reino de Deus suporta as contradições! Essa verdade é exposta em todas as explicações que Jesus faz para nos ensinar o que está acontecendo no mundo.
Para começar, o mundo é uma obra de arte perfeita, cujo artista tolera com paciência vê-la ser corroída com as intervenções desastrosas de seus herdeiros.
O mundo foi pensado bom, mas de três a doze no Gênesis a harmonia originária entre Deus e o humano, o homem e a mulher e entre irmãos foi deteriorada. Adão e Eva se escondem de Deus; Adão acusa a sua mulher, a natureza se torna dura, e Caim rejeita a diferença de Abel.
Gênesis um e dois passaram a ser sonhos distantes de um paraíso perdido. Por isso, a história longa e cansativa a partir dali é a lenta reconstituição daquela realidade querida pelo artista original.
Em Mateus 13,24-43, Jesus explica como estão as coisas atualmente. O campo parece ser uma figura importante para representar o Reino. O Reino, entretanto, não é a única realidade presente no mundo! Ele já está presente, mas como em outras semeaduras, juntamente com ele também crescem coisas menos boas.
A oposição, que é uma marca da força humana e da arrogância daqueles que destruíram a primeira obra, não é mais promissora para reengendrar um mundo novo. Por isso a Sabedoria declama: “dominando tua própria força, julgas com clemência” (Sb 12,18).
Para que os corações dos discípulos não se enganem, Jesus lhes conta de como a face da terra está contaminada pelo mal. A história do passado é, então, trazida para o presente e apresentada de modo que possamos compreender.
O campo semeado originariamente já não existe mais, pois na surdina da noite o inimigo espalhou sementes ruins, e o trigo foi invadido. A purificação arrancando o trigo e o joio antes da hora não é coisa recomendável.
A paciência de ser no meio do joio parece a única proposta viável. Os dois deverão crescer juntos, como já mostra a nossa experiência. O bem, porém, não poderá retroceder. Vem em socorro de nossa compreensão a imagem do grão de mostarda, que sendo a menor de todas as sementes, ao crescer se torna a maior de todas as plantas (Mt 13,32), até sufocar o que ali não deveria estar.
O bem é a trave que destrói a roda do mal. Os retoques no mundo passam pela necessidade de reconciliação entre o ser humano e Deus, entre os irmãos e entre nós e a natureza. Assim, o Reino poderá crescer e domar às sementes do mal que foram espalhadas pela plantação.
As sementes do bem não matarão o mal, mas ao crescer se tornarão preferíveis às outras plantas, pois o mal que tudo desagrega é restritivo, mas tende a sucumbir diante da beleza do bem. Na paciência da espera, o bem não pode ceder a tentação do mal, nem se tornar ele mesmo um mal, pois isso seria a sua derrota.
Sabendo desta tentação, Jesus recomendou que deixássemos os dois crescerem juntos, apostando em apenas um lado. Na colheita, o bem e o mal serão separados. Encantar-se pelo procedimento dos malvados é conceder-lhes a vitória, porque o mal é restritivo e seu destino é ser sempre menos.
O Reino de Deus, portanto, pode aceitar a contradição. Ele está presente no mundo e é o próprio mundo naquilo que é desejável e harmônico, sem ceder a tentação de tudo destruir.