Dom Lindomar Rocha Mota
Bispo de São Luís de Montes Belos (GO)
São muitos os avisos para que se afastasse de Jerusalém. O próprio Jesus traçou o perfil homicida da cidade ao dizer: “Jerusalém, Jerusalém, que mata os profetas e apedrejas aquele que te foram enviados” (Mt 23, 37). Não são poucos os decaídos perante a sua insensibilidade. Boa parte da história da salvação se alquebrou entre os seus muros.
É para lá que Jesus se dirige. Dando início a mais Santa de todas as Semanas, que começou com a sua decisão irremovível de adentrá-la (Mt 20,17), mesmo sabendo que os ânimos não eram benfazejos por lá!
A vida em Jerusalém se tornara difícil. A grande ideia por trás daquela cidade havia decaído desde há muito tempo. O Reino se afastara de suas perspectivas, e todo tipo de interesse passou a se acomodar nela. A sua natureza corrompida deixou de guiar a antiga esperança de Israel, e onde essa esperança decai a torpece e a vilania se instalam. Sem vigor para uma esperança robusta começa-se a esperar em amenidades.
Esse decaimento da grande esperança faz nascer traições como a de Judas; desistências como a do jovem rico ou mediocridades políticas como as de Pilatos.
O coração da humanidade, esvaziado das grandes ideias, sucumbe na escuridão e no vazio. Por isso, Jesus tomou a forte decisão de reconstruir Israel.
Uma Israel nova, não mais fundada sobre a repartição política de doze tribos, mas sobre doze corações abissais que fossem capazes de comportar a profundidade proposta por Deus.
Não mais doze tribos, mas doze homens, e um número sempre crescente de outros discípulos e discípulas, dos quais muitos nomes conheceremos nesses dias santos da Semana que estamos vivendo.
Para refundar a ideia da Cidade santa e escolhida por Deus, é preciso migrar do exterior para o interior, de fora para dentro, num movimento que introduz algo novo no desconhecido da alma humana, onde Jesus é Mestre e Senhor.
Nesse deslocar-se de fora para dentro, palavras e discursos funcionam pouco; pois um discurso responde a outro discurso; uma palavra responde a outra palavra, mas o coração só muda por aquilo que ele ama.
Ao decidir ir para Jerusalém, o Mestre, a quem tanto amamos, o fez para falar com a própria vida, mostrando que a esperança só pode ser refeita a partir de dentro. A ideia, por trás da cidade de Jerusalém, não repousa em seus muros, mesmo que esse muro seja o do templo, mas na coragem de quem acredita que é possível um mundo novo.
Ao entrar em Jerusalém acompanhado, Jesus demonstra que não se pode sentar a mesa para debater a sorte de outros sem que os outros estejam presentes. O testemunho da coragem de quem está disposto a realizar, em sim mesmo, a reconstrução da esperança da cidade Santa é norteadora para aqueles que ainda se perguntavam como o Reino aconteceria.
Refeita essa construção os discípulos do Reino entendem que não há caminho fácil. As tradições endurecidas podem impedir esse caminho, interrompendo muitas novas sementes de germinar. A velha Jerusalém foi destruída, e dela não sobrou pedra sobre pedra. Os discípulos a reconstruíram em si mesmos e a fizeram brilhar até os dias de hoje, tudo isso porque seguiram o Mestre até o fim, aniquilando o que já não funcionava mais, e inaugurando os tempos do Reino. Essa foi a razão pela qual Jesus foi a Jerusalém!